Voluntariamente ofereço a homens abertos e benevolentes, algumas idéias sobre este importante assunto, propondo algumas questões e acrescentando a cada uma delas o que parece ser a resposta óbvia e direta.
I. Primeiro pergunto: por que milhares de pessoas estão morrendo de fome em toda a nação?
Que é um fato eu sei, pois o tenho visto com meus próprios olhos por todo o canto da terra. Conheço pessoas que só podem comer uma refeição um dia sim, outro não. Conheço outra pessoa que embora a poucos anos tivesse todas as conveniências da vida, hoje cata do estéreo larvas fedorentas e as leva para casa para repatir com os filhos. "De fato quase desmaiando e tão fraca, que quase não podia andar, até que o meu cachorro, não achando nada em casa, saiu e trouxe de volta um osso em estado relativamente bom, o qual tirei e fiz um bom jantar". Hoje este é o caso de multidões, numa terra transbordando, por assim dizer, de leite e. mel, abundante de todas as necessidades, conveniências, superfluidades da vida! Então, por que é assim? Por que tantos não tem nada para comer? Por que muitos não encontram nada para fazer?
A razão de não terem nada para comer é a falta de emprego.
II. Mas, por que não têm emprego?
Porque os ex-patrões não podem mais mantê-los. Não podem empregá-los porque não tem mercado para seus produtos; os alimentos são tão caros que a maioria do povo não pode comprar quase mais nada.
III. Mas, por que os alimentos são tão caros?
Particularmente, por que a farinha esta tão cara? Deixando de lado questões parciais, a causa principal é que enorme quantidade de milho são usados para fabricar bebida. Juntando todos os fabricantes da Inglaterra, temos razão para crer que um pouco menos da metade do trigo produzido no reino, cada ano, é consumido na fabricação desse perigoso veneno; não somente a força física e a vida, mas também os valores morais de nossos compatriotas.
Esse fato pode ser rejeitado: "Isto não é possível. Sabemos pelo imposto pago, quanto milho é destilado!" Sabemos mesmo? Não haverá dúvida de que todo imposto é pago sobre o milho destilado? E que dizer do grande número de alambiques particulares que não pagam qualquer imposto? Eu mesmo já ouvi de um empregado de um eminente destilador ocasionalmente declarar que para cada litro, sobre o qual pagou imposto, ele destilou seis sobre o qual não pagou nada. Sim, já ouvi destiladore.s afirmarem:
"Temos que fazer isto para sobreviver". Logicamente, então não podemos julgar pelo imposto pago quanto milho é usado na fabricação de bebida.
IV. Mas, e a aveia, por que é tão cara?
Porque o números de cavalos para carruagens e charretes particulares é quatro vezes maior do que era quatro anos atrás. Se não se produz quatro vezes mais aveia do que se produzia há quatro anos, o preço não pode ser o mesmo. Se apenas duas vezes da quantia é produzida, obviamente o preço dobrará.
O aumento do preço de um cereal sempre aumenta o de outros; o alto preço do trigo e da aveia também causa o aumento do preço da cevada.
V. Por que as carnes de boi e de carneiros são tão caras?
Porque muitos fazendeiros que criavam grandes rebanhos de ovelhas e de gado, ou ambos, agora não criam nada. Eles podem melhor aproveitar a terra criando cavalos para exportação.
VI. Mas por que o porco . as aves domésticas e os ovos são tão caros?
Por causa da monopolização das fazendas; talvez o monopólio mais diabólico jamais introduzido neste reino. A terra que alguns anos atrás era dividida entre dez ou vinte pequenos posseiros e que lhes permitiam sustentar suas famílias confortavelmente é agora englobada por um grande fazendeiro. Um fazendeiro tem agora um patrimônio que sustentava dez ou vinte famílias. Cada uma delas tinham porcos e. aves domésticas que voluntariamente enviavam ao mercado. Os mercados, portanto, eram abastecidos e a abundância mantinha os preços ao alcance do povo. Os fazendeiros, entretanto, não se importam com isso. O luxo é oura coisa, a mais terrível de todas, a mais destrutiva da felicidade pessoal e social.
Por que não somente a carne de boi, o carneiro e o porco, mas também todos tipos de alimentos são tão caros? O que pode vencer o luxo? É só examinar a cozinha dos poderosos, dos nobres e da corte, quase sem exceção, e, observado o surpreendente desperdício, não mais se admirará a escassez, e do resultante alto custo daquilo que eles com tanta agilidade destroem.
VII. Mas por que a terra está tão cara?
Porque pelas razões acima, a aristocracia não pode viver da forma que esta acostumada, sem aumentar sua renda, o que a maioria só pode fazer aumentando os aluguéis. Assim, o posseiro, pagando mais aluguel pela terra, precisa ganhar mais pelos produtos. Isto, por sua vez, aumenta o preço da terra e assim a roda gira.
VIII. Mas por que os impostos são tão altos?
Por causa da dívida nacional. Eles tem que ser mantidos altos enquanto a dívida existir. Ouvi dizer que o orçamento nacional setenta anos atrás era, em tempos de paz, aproximadamente três milhões de libras por ano. Agora, só os juros da dívida pública são quatro milhões por ano!
Resumindo então: milhares de pessoas em toda a terra estão morrendo por falta de alimentos. Isso é devido a diversas causas mas, acima de tudo, à fabricação de bebida, aos impostos, ao luxo.
Aí está o mal e as inegáveis causa dele. Mas onde está o remédio?
Talvez exceda a sabedoria humana dizer. Mas não seria um erro oferecer algumas sugestões sobre o assunto:
l. Qual o remédio para curar esta úlcera maligna para milhares de pessoas morrendo de fome?
Arranjar emprego para elas, e elas acharão o seu sustento.
2. Mas, como a aristocracia pode arranjar-lhes emprego sem se arruinar?
Procure um mercado para o seu produto e os patrões lhe darão emprego de sobra. E isto se faz diminuindo os preços dos alimentos, pois assim o povo terá também dinheiro para outros produtos.
3. Mas como reduzir o preço do trigo e da cevada?
Proibindo, para sempre, acabando completamente com aquela praga à saúde, aquela destruidora da força humana, da vida, e da virtude, que é a fabricação da bebida! Isto em si provavelmente resolveria quase tudo. O preço do milho abaixaria pelo menos um terço.
4. Como reduzir o preço da aveia?
Reduzindo o número de cavalos. E seria possível fazer isso (sem prejudicar o lavrador, o carroceiro, ou quaisquer outros que empregam cavalos no seu trabalho):
a) Estabelecendo um imposto de dez libras sobre cada cavalo exportado para a França;
b) Estabelecendo um imposto sobre as carruagens da aristocracia.
5. Como reduzir o preço da carne de boi e do carneiro?
Aumentando os rebanhos de ovelhas e de gado. E isto acontece sete vezes mais, se o preço dos cavalos fosse diminuído.
6. Como reduzir o preço do porco e das aves domésticas?
Primeiro, não arrendando terras a preço superior a cem libras por ano; segundo, diminuindo o luxo, por lei e por exemplo, ou por ambos.
7. Como reduzir o preço das terras?
Por todos os modos acima mencionados, visto que cada um contribui para diminuir as despesas de capital, especialmente o último - restrição do luxo, que é maior e a principal fonte de necessidade.
8. Como diminuir os impostos? Primeiro, acabando com a metade da dívida nacional, economizando desta maneira cerca de dois milhões de libras por ano; segundo, acabando com todas as ridículas pensões dadas a centenas de pessoas à toa, tais como as de governadores de fortalezas ou castelos, que nestes cem anos só abrigaram gralhas e corvos.
Mas isto será feito? Receio que não. Pelo menos não temos razão de esperar, sendo as Escrituras verdadeiras, de uma nação tal como esta, onde há tão profundo, declarado e completo desprezo a toda religião e não temor a Deus? Parece que resta apenas Deus atuando por sua causa. E, assim sendo, que caiamos nas mãos de Deus e não dos homens.
Lewisham, Inglaterra, 20 de fevereiro de 1.773."
Texto extraído de The Works of John Wesley, Vol XI, 53-59.
John Wesley foi ministro anglicano e fundador do Metodismo.